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O rezador

...TITO fica apreensivo, pois o Rezador está botando fogo no roçado da maneira mais perigosa possível: a favor do vento. E ao ver as primeiras labaredas...

JOCA morava no vilarejo de Cafundós do Judas, no município de CUSTIPIU, no Sertão da Bahia. Ele era conhecido em toda a região como o maior REZADOR, pois tinha reza para todo e qualquer problema que seus potenciais clientes precisassem, desde desavenças amorosas, brigas entre vizinhos, maltriste e daí por diante. Das suas atividades de rezador, as que lhe rendiam maior plateia era quando, em suas gabolices, ele dizia ter poderes para colocar cobras para fora de qualquer área rural que ele quisesse. E a mais poderosa das suas preces lhe dava o poder de dominar o fogo, não importando qual fosse a intensidade.


A fama de JOCA REZADOR aumentava a cada dia. Vinha gente de toda a redondeza em busca dos seus serviços. TOTI estava muito preocupado com o tempo, pois o verão estava bastante forte e as pastagens muito secas. Ele tinha feito uma grande área de roçagem e precisava queimá-la a fim de jogar as sementes de capim. O problema era que o risco do fogo se propagar era muito grande e o prejuízo seria incalculável, tornando grande o seu dilema.


Estava ele tomando uma cervejinha no boteco de RAFA, quando soube a fama de JOCA REZADOR. Pronto! Estava resolvido o seu problema e, após se informar onde encontrá-lo, foi ao seu encontro. Conversou com JOCA, que ao saber qual era o serviço foi logo tranquilizando TOTI, dizendo:


- Amigo, seu serviço é delicado, porém você está diante do único homem capaz de resolvê-lo.

- Sabe como é, né seu JOCA? Se o fogo se espalhar, o prejuízo vai ser grande.

- Fique tranquilo, homem de Deus. Saiba que eu já sai daqui pra apagar fogo até em São Paulo.


Convencido, TOTI marca a queima da roçagem para daí a dois dias. Na hora marcada, às 10h, TOTI, JOCA REZADOR e mais dez trabalhadores levados por TOTI já se encontram no local da roçagem. JOCA, todo vestido de branco, com um pacote de velas na mão, pede a todos para se afastarem e ficarem em silêncio pois ele precisa de concentração máxima para falar com seu Santo Protetor.


À distância, TOTI e seus homens veem ele levantar os dois braços aos céus, ouvem alguns gritos indecifráveis. JOCA acende as velas e as coloca em vários locais da roçagem, de onde logo aparece um filete de fumaça, indicando que as velas acesas passaram o fogo para o mato cortado e seco. TOTI fica apreensivo, pois o Rezador está botando fogo no roçado da maneira mais perigosa possível: a favor do vento. E ao ver as primeiras labaredas do fogo grita:


- Rapazes, vamos apagar este fogo pois ele está começando de maneira errada.

- Se preocupe não, seu TOTI. Eu sei o que estou fazendo - Grita JOCA.

- Acho bom que saiba mesmo, moço. Porque se não souber vou lhe dar uma surra.


E o fogo começa a aumentar de intensidade, fugindo do controle daqueles homens. JOCA REZADOR continuava a levantar os braços ao céu, a gritar palavras ininteligíveis. De repente, TOTI vê o Rezador correndo, fugindo do fogo e gritando:


- Com vela te botaram, com reza eu te tiro, com os poderes de Deus e da Virgem Maria. Fogo, obedece ao teu criador, desgraça. Tu quer acabar comigo?

- Peraí, Rezador. Pra onde tu vai correndo, assim? Grita TOTI.

- Eu vou é me picar. Este fogo é teimoso demais e acabo de me lembrar que tenho um compromisso no Paraná e estou atrasado.

- Peraí, desgraça, que eu te pego! E se eu te pegar, tu vai primeiro pro inferno, antes de chegar no Paraná.


Enquanto o fogo foge do controle humano, os homens que foram para trabalhar observam JOCA REZADOR desaparecer na fumaceira que se forma, enquanto TOTI corre como um maluco na tentativa de pegá-lo.


E foi a última vez em que TOTI queimou uma roçagem. Também foi a última vez em que JOCA REZADOR foi visto na região. Tomara que ele tenha chegado a tempo no compromisso que tinha no Paraná...


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